THIAGO AMÂNCIO – FOLHA DE S. PAULO
A gestão do prefeito João Doria (PSDB) decidiu reduzir o número de professores que têm o papel de substituir os titulares das salas de aulas e também atuar em outras funções pedagógicas nas escolas.
Espécie de "coringas", esses professores substitutos são fixos nas escolas e já atuam com alta demanda no dia a dia, em uma rede de ensino com salas superlotadas sobretudo na pré-escola e um alto índice de profissionais faltosos ou licenciados. Sem um substituto imediato, quando uma turma fica sem professor, por exemplo, a direção da escola tem de distribuir os alunos entre outras turmas de mesmo nível.
Essa redução dos substitutos, porém, não acarretará em nenhuma demissão. Os professores dessa categoria serão redirecionados a unidades onde faltam professores titulares, sobretudo na periferia de São Paulo. Até o fim do ano 9.000 professores aprovados em concurso serão chamados pela gestão.
Na prática, de um lado, o corte dos substitutos deixa os estudantes mais vulneráveis às faltas de professores –na rede municipal da capital paulista, em média, um professor falta 36,5 dias por ano, segundo levantamento feito pela Folha em julho passado.
Questionário da Prova Brasil respondido por 541 diretores de escolas da rede municipal em 2015 apontou que 77% deles acreditam que o funcionamento da escola foi dificultado pelo alto índice de faltas de professores. O corte dos substitutos foi publicado em portaria no último sábado (23) e gerou críticas entre sindicatos e professores, que alegam falta de diálogo com a prefeitura.
Nesta quarta (27), porém, o secretário Alexandre Schneider (Educação) se reuniu com as entidades e deve publicar uma nova regra nesta quinta (28), que torna a mudança mais amena, mas ainda com a redução dos professores coringas nas escolas.
Um exemplo: uma escola de educação infantil com dez turmas deveria ter três professores substitutos de acordo com a regra anterior. Com a nova norma da gestão tucana, serão apenas dois. A prefeitura não informou a quantidade de professores desta categoria atualmente na rede e como ficam os quadros com a nova portaria.
Segundo o Sinpeem (Sindicato dos Profissionais em Educação no Ensino Municipal de SP), hoje há 3.244 professores nessa categoria para atender a creches e à rede de educação infantil. Com a mudança proposta no sábado, seriam 2.709. Com a nova mudança, prometida pela secretaria após reunião com entidades de classe, o sindicato estima que restem 3.055.
A diretora de uma escola no Capão Redondo, zona sul, e que não quis se identificar, diz que a medida gera um ciclo vicioso. Quando uma turma fica sem professor e não há substituto disponível, a escola distribui os alunos entre as outras turmas de mesmo nível –por exemplo, se há três turmas do 3º ano com 30 pessoas e uma delas fica sem professor, as outras duas turmas ficarão com 45 alunos cada.
Se há mais alunos em sala, diz ela, o professor fica sobrecarregado, de modo que aumentam as chances de ficar doente e precisar sair de licença –o que acarreta em mais professores faltosos. Para Priscila Cruz, coordenadora do Todos pela Educação, a medida é preocupante, pois há "um grande risco de não ter uma alternativa à falta de docentes".
"Não haver um professor substituto não é necessariamente um problema, mas precisa ter alternativas. O que não pode é o aluno ficar sem aula. Um dos maiores fatores de aprendizagem baixa no Brasil é porque o aluno tem pouca exposição ao aprendizado."
Professor da UFABC e membro da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Fernando Cassio diz que "há uma crença de que, se fizer a gestão adequada dos recursos, pode-se trabalhar com menos". "Mas não existe menos em educação. A educação brasileira está farta de trabalhar com menos."
"Professores não são peças de xadrez, que você pode remover e colocar no tabuleiro vizinho. São pessoas que constroem o projeto pedagógico de uma escola, que têm vínculos. A cultura pedagógica de uma escola depende das pessoas que trabalham lá."
O desafio do município para contratar novos professores envolve não apenas a questão orçamentária como também o fato de a profissão atrair cada vez menos interessados. Há uma série de explicações para isso, como o baixo salário (se comparado com outras de formação superior), a falta de estrutura e casos de violência em sala de aula.
Em maio passado, uma outra medida da gestão Doria provocou efeito colaterais para tapar um outro buraco na estrutura do ensino do município. A prefeitura passou a fechar espaços como brinquedotecas e salas de leitura nas escolas para criar salas de aula para atender crianças de 4 e 5 anos. Assim como agora, essa medida também foi alvo de críticas de professores e especialistas por precarizar o ensino.
EQUILÍBRIO
O secretário Municipal de Educação, Alexandre Schneider, diz que o objetivo da mudança é "dar equilíbrio à rede" e "ter professores nas áreas centrais e na periferia. Afirma ainda que a mudança afeta "funções, e não pessoas", porque o atual modo de distribuição de professores "existe há dez anos e nunca foi ocupado integralmente".
Segundo ele, não haverá alunos sem aula por falta de professor substituto em escolas, "a menos que aumente muito o absenteísmo, que é um dado que a gente não trabalha".
Schneider, que também foi titular da Educação municipal durante a gestão de Gilberto Kassab, lembra que a atual gestão tem ampliado o número de docentes. "No fundo, nós não estamos reduzindo nada. Nós colocamos 9.000 professores a mais. A gente fez metade em oito meses do que a gestão anterior fez em quatro anos. Quem quer cortar não chama tanto professor", diz.
Após receber críticas por falta de diálogo com as entidades de classe, a prefeitura se reuniu com sindicatos nesta terça, voltou atrás e atenuou as mudanças na rede. "O que você tinha [até a portaria publicada no sábado] era uma redistribuição dos cargos de professores substitutos. [Na nova mudança, ainda não publicada] muda em uma intensidade menor do que na portaria de sábado."
Schneider admite que houve falha na comunicação com os professores antes de publicar as mudanças. "A secretaria poderia ter feito uma conversa prévia e não fez. Inclusive eu já reconheci. Não é uma questão de diálogo, mas é uma questão de fazer uma comunicação mais adequada", disse.
Ele afirma que haverá uma série de mudanças na rede escolar além da redistribuição de professores, dentre elas uma novo limite de 29 alunos na pré-escola e a criação de 900 turmas de ensino fundamental 2, com alunos do 6º ao 9º anos.
Matéria publicada na Folha de S. Paulo.