Um Brasil cada vez mais motorizado

A frota atual já é duas vezes e meia a existente em 2001 e segue crescendo apesar da crise

Mariana Barros, O Estado de S.Paulo

Nem mesmo a crise econômica dos últimos anos foi capaz de frear a quantidade de carros circulando pelas já congestionadas ruas do país. Um estudo realizado neste ano pelo Observatório das Metrópoles, ligado ao Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia, mostra que a frota brasileira já ultrapassada 61 milhões de veículos. O total representa quase duas vezes e meia a quantidade existente em 2001.

Esses automóveis estão concentrados nas maiores cidades e regiões metropolitanas, mas, mesmo nos municípios menores, a presença dos carros cresce em ritmo elevado. A taxa de motorização brasileira, proporção de automóveis por cada 100 habitantes, passou de 14,4 em 2001 para 29,7 no ano passado.

O relatório destaca que o aumento do número de automóveis coincide com o período de crescimento econômico, quando também houve um forte aumento de renda. O movimento ganhou ainda o impulso das desonerações fiscais, que incentivaram as vendas das montadoras em todas as regiões.

Se por um lado a iniciativa aqueceu a economia, por outro lado gerou um sério efeito colateral no dia a dia das cidades. Sem nenhuma estratégia para absorver todo este contingente extra, as vias ficaram entupidas, situação que se traduziu em congestionamentos generalizados.

Para agravar o quadro, prefeituras e governos estaduais seguem priorizando a construção de avenidas e viadutos em vez de criar políticas eficientes para o transporte público. Estudos apontam que, em vez de melhorar, ampliações e abertura devias pioram o fluxo. Foi o que aconteceu em São Paulo.

Em 2010, o governo do Estado havia investido R$ 1,5 bilhão para abrir uma nova pista central na via expressa da marginal Tietê. Passados cinco anos, em 2015, a Companhia de Engenharia de Tráfego (CET) divulgou um estudo mostrando que a lentidão no final da tarde havia subido até 80% no local. A média de engarrafamento naquele horário saltou de 19,8 quilômetros, em 2010, para 37,5 quilômetros em 2015.

O fenômeno é fácil de ser explicado: qualquer espaço criado para os carros estimula mais carros a usufruí-los. Com isso, o alívio inicial é anulado em pouco tempo. Como definiu o urbanista e ex-prefeito de Curitiba Jaime Lerner: “Uma ponte é o caminho mais curto para dois engarrafamentos”.

Foco dos investimentos viários, a região Sudeste concentra a maior frota do país. Não por coincidência, região detém as maiores cidades brasileiras. Mais da metade da frota nacional (54,2%) circula nesta área.

De 2001 e 2016, a frota do Sudeste um aumentou em 114%, passando de 14,2 milhões para 32,9 milhões. Já a taxa de motorização (carro por 100 habitantes) subiu de 19,9 para 36,3. Para se ter uma ideia, o crescimento vivenciado pelo sudeste corresponde a quase metade do crescimento nacional no mesmo período. A proporção de carros por habitante praticamente dobrou em apenas cinco anos.

Segundo o Observatório, o uso do carro se explica não apenas pelas questões estruturais, mas também pelas vantagens individuais que oferece: a liberdade de traçar itinerários, a comodidade de fazer a viagem porta a porta e a vasta oferta de estacionamento, inclusive gratuito, nas diversas áreas urbanas onde é permitido parar na rua.

Ao mesmo tempo, 80% dos motoristas afirmam que deixariam o carro em casa se houvesse uma boa alternativa de transporte, de acordo com pesquisa da Rede Nossa São Paulo. O problema está instaurado, e a busca por soluções, também.

Matéria publicada no jornal O Estado de S. Paulo

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