Registros de quedas em 2017 chegou a mais de 4 mil, o dobro da quantidade vista há cinco anos. Aumento ocorreu em 30 das 32 prefeituras regionais. Gestão Doria diz que equipes de poda terão mil funcionários
Marco Antônio Carvalho, O Estado de S.Paulo
Mesmo com chuvas menos volumosas, a quantidade de quedas de árvore registradas na cidade de São Paulo em 2017 foi a maior dos últimos cinco anos: 4.119 casos, o equivalente a 11 por dia. Dados da Prefeitura mostram que, apesar da concentração de ocorrências na zona oeste, a cidade viu as quedas se tornarem mais frequentes em todas as suas regiões – em 30 das 32 áreas das prefeituras regionais o número aumentou.
A gestão do prefeito João Doria (PSDB) diz que está concluindo pregão para contratação de novas equipes de poda, que começarão a atuar na próxima semana, mas especialistas chamam atenção para a necessidade de a cidade conhecer melhor a quantidade, o tipo e a situação de saúde da arborização urbana. Uma tempestade que atingiu a cidade nesta terça-feira, 20, derrubou 137 árvores, além de ter causado 24 desabamentos. Na Vila Mariana, onde choveu 85 milímetros, houve o maior número de registros dessa semana: 27.
Ao mesmo tempo em que viu o número de quedas subir, a gestão não conseguiu aumentar substancialmente a realização de podas nas ruas da capital. Os 96 mil serviços dessa natureza realizados no ano passado é 7% maior que 2016, mas 30% menor que as 138 mil podas feitas em 2008, por exemplo. A Prefeitura detém a exclusividade do serviço de análise e retirada de galhos, quando é confirmada a necessidade de podas em árvores localizadas em logradouros públicos. Muitos, no entanto, chegam a esperar meses sem resposta do poder público e temem pelo risco que plantas doentes ou enroscada a fios representam para a segurança.
Os dados de quedas e podas computados pela Secretaria Municipal da Segurança Urbana e pela Secretaria das Prefeituras Regionais foram obtidos pelo Estado por meio da Lei de Acesso à Informação. As informações das quedas continham endereço, data e hora do chamado, o que permitiu que fosse construído um mapa com cinco anos de ocorrências na cidade. No período, os casos são mais volumosos nas prefeituras regionais de Pinheiros, Butantã, Vila Mariana, Lapa e Sé, áreas consideradas mais arborizadas.
Para o botânico Ricardo Cardim, o poder público tem de entender a importância da árvore para a saúde pública. “Não se trata de um elemento decorativo. É uma ferramenta de saúde pública porque reduz o barulho, deixa a cidade com menos poeira, aumenta a umidade do ar, recicla os gases tóxicos e tem impacto sobre enchentes”, disse. “A cidade cresceu de forma caótica e agora precisa encontrar o espaço adequado para árvores.”
Uma análise temporal das ocorrências permite identificar que os casos foram aumentando em todas as regiões. Em Perus, na zona norte, os seis casos de 2013 viraram 51 em 2017. Em Ermelino Matarazzo, zona leste, de 10 para 71. Ainda assim, com exceção da Capela do Socorro que liderou as ocorrências no ano passado, os dados ficam concentrados na zona oeste e sul ,no centro expandido. Pinheiros (273), Vila Mariana (255) e Butantã (237) foram as áreas com mais casos de janeiro a dezembro passado do ano passado.
Cardim diz que historicamente a capital não cuida bem das suas árvores. “Isso infelizmente vem de muitos anos. Sequer temos contabilizada a quantidade delas. Hoje, julgo que não existe uma rua na cidade que tenha 100% das suas árvores bem cuidadas. Há podas drásticas por causa da fiação elétrica e que podem trazer mais problema, aa possibilitar a contaminação da planta por fungos, por exemplo, o que leva a quedas posteriormente”, disse.
Segundo o botânico, bairros mais tradicionais concentram as árvores mais antigas da cidade, com 80, 90 anos, “vítimas de maus tratos”. “Elas foram sendo machucadas e chegam ao final da vida muito maltratadas. Mas não dá para sair cortando. É como se entrássemos numa ala de idosos de um hospital e fizéssemos eutanásio em todos. Não é assim que se administra essa situação.”
Não dá para atribuir o aumento de quedas somente à ocorrência de chuvas. A precipitação medida pelo Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) na cidade de São Paulo em 2017 mostra que o patamar (1,547 milímetros) foi menor do que em 2016 (1,569) e em 2015 (1,896).
Planejamento
O vereador Gilberto Natalini (PV) ocupou até agosto do ano passado o cargo de secretário do Verde e Meio Ambiente da cidade de São Paulo. Ao Estado, o parlamentar disse ser necessário modificar a Lei de Arborização, iniciativa que começou a realizar como integrante da Gestão Doria, mas que agora toca na Câmara Municipal, onde deverá, em abril, apresentar um projeto de lei com esse objetivo.
Em 2017, ao ser anunciada, a intenção causou polêmica porque permitiria que o cidadão contratasse um serviço de análise e depois a própria poda da árvore de rua, o que hoje é prerrogativa do poder público. “Hoje, a lei, da época de Jânio Quadros, representa uma dificuldade. Queremos facilitar poda e plantio. Hoje, quem quer plantar, não consegue. Vamos tentar mudar isso pelo Legislativo”, disse. A reportagem questionou a Prefeitura sobre o andamento do projeto no Executivo, mas não obteve resposta.
O aposentado Roger Cahen, de 70 anos, teme pela falta de poda em uma árvore na Rua Cônego Eugênio Leite, em Pinheiros, onde mora. Diz ele que a planta, em contato com a rede elétrica, apresenta um risco para a vizinhança. Seus pedidos de poda, porém, restaram ignorados pela Prefeitura, segundo conta. “Eles plantaram um monstro, que cresceu demais. Tenho três protocolos sem resposta junto à Prefeitura. Não sei mais o que fazer. Ninguém liga para a nossa preocupação. Um dia de ventania forte vai derrubá-la. É uma questão de tempo.”
Natalini estima em 652 mil as árvores nos logradouros públicos da capital, das quais, diz, 30% estariam doentes. “Seja por algum problema na raiz, infestação por pragas, cupim, podas mal feitas. Isso adoece as árvores e as torna vulneráveis às tempestades”, disse. Ele disse ter iniciado uma licitação para conseguir quantificar a arborização urbana por meio de uma metodologia por satélite, mas, segundo ele, o projeto não foi levado para a frente após a sua saída.
Equipes de poda passarão a ter mil funcionários, diz Prefeitura
A reportagem questionou as Secretarias do Verde e das Prefeituras Regionais sobre as razões para o aumento nas quedas de árvore e a redução nas podas. A pasta do Verde não comentou o assunto, enquanto as Prefeituras Regionais se limitou a comentar a situação das podas. Disse que neste mês a Prefeitura de São Paulo concluiu o pregão para contratar novas equipes de poda e áreas verdes, que começam a atuar em toda a cidade na próxima semana. “Este processo não era realizado desde 2014, o que inviabilizou, desde janeiro de 2015, a contratação de novos funcionários. A atual gestão retomou o processo licitatório em 2017 e, após a liberação do Tribunal de Contas do Município, está aumentando de 34 para cem as equipes, que somam cerca de mil funcionários.”
Destacou que mesmo com redução de equipes, o número de podas no ano passado foi superior a 2016 – 98.362 e 89.958, respectivamente, “em razão do remanejamento entre as Prefeituras Regionais que ainda tinham contrato em vigor”. “Paralelamente, a Prefeitura firmou um convênio com a Eletropaulo que prevê 200 mil podas em áreas com fiação até o final deste ano”, informou.
Em fevereiro, acrescenta a nota, a Prefeitura criou um grupo de trabalho para discutir melhorias e ações sobre a arborização no município. Atualmente, estima-se que há 650 mil árvores somente no viário da cidade. Foi informado ainda que Pinheiros, Butantça, Santo Amaro, Capela do Socorro e Vila Mariana são as regiões com maior presença de árvores no viário urbano. /COLABORARAM VINÍCIUS SUEIRO E RODRIGO MENEGAT
Matéria publicada no jornal O Estado de S. Paulo.