Concessão das marginais tem entrave político, não técnico, diz especialista

EDUARDO GERAQUE – FOLHA DE S. PAULO

A ideia do prefeito João Doria (PSDB) de fazer uma concessão das marginais Pinheiros e Tietê é muito mais complicada do ponto de vista político do que em termos técnicos –principalmente se houver a decisão de cobrança de pedágio para os usuários.

"O Brasil tem feito concessões comuns de rodovias ou de pontes, como é o caso da Rio-Niterói, mas não em vias urbanas", afirma Carlos Ari Sundfeld, professor da FGV Direito.

O tucano levou esse tema nesta segunda (8) ao governador Geraldo Alckmin (PSDB) e pediu auxílio para formatar um projeto de PPP (Parceria Público-Privada) ou concessão simples –como existe nas rodovias paulistas.

Embora não descarte a cobrança de pedágio, Doria buscou atenuar a intenção. "Nem foi mencionado isso [pedágio] na reunião. Não se descarta nada na vida. Mas esse tema não faz parte das discussões nossas aqui. Não é tema em debate, em pauta, zero."

O especialista diz que a concessão em tese é viável –e cita exemplos em outras partes do mundo, caso de uma via urbana com pedágio em Santiago, no Chile. O principal entrave é a impopularidade devido à cobrança dos motoristas.

"É politicamente muito difícil colocar pedágio em uma via urbana, especialmente se é uma via já existente [como é o caso específico das marginais]", afirma o professor de direito.

No caso das marginais Pinheiros e Tietê, Sundfeld afirma ser mais viável politicamente, para a operação ter êxito, que o poder público opte por uma concessão administrativa.

Trata-se de um tipo de Parceria Público Privada, em que a parte privada é a responsável pelos investimentos e manutenção da via pública, mas cabe ao setor público remunerar totalmente a empresa.

"O desafio aqui é a prefeitura encontrar garantias para oferecer ao setor privado", diz o professor.

Por outro lado, a prefeitura está sem margem nos cofres municipais para subsidiar investimentos –tendo inclusive feito uma série de cortes neste ano.

Existem contratos de PPP nos quais uma parte é bancada pelo setor público, mas outra parcela é paga com o valor arrecadado pelo pedágio. Neste caso, apesar da cobrança, ela é menor, atenuando o desgaste.
 

MEDIDAS

As marginais, por onde trafegam 1,2 milhão de veículos por dia, foram alvo de uma promessa eleitoral de Doria: a elevação dos limites de velocidade, implantada pelo tucano desde 25 de janeiro.

Como mostrou a Folha, a medida foi seguida do aumento de acidentes com vítimas nos dois meses seguintes envolvendo tanto motos como carros e caminhões, conforme dados da PM.

Ao mesmo tempo, a prefeitura não tem conseguido cumprir medidas prometidas para deixar as pistas mais seguras –como a retirada de camelôs e moradores de rua.

O plano de privatização ou concessão de aparelhos municipais é outra bandeira de Doria, que já havia listado 55 itens para desestatização.

A reunião entre Doria e Alckmin também teve a participação de diretores do grupo CCR, que administra concessionárias de rodovias de São Paulo, como os sistemas Castello Branco-Raposo Tavares e Anhanguera-Bandeirantes.

A concessão e a implantação de pedágio eletrônico nas marginais Tietê e Pinheiros (por meio de chip nos carros) já foi discutida por representantes da CCR com prefeitos anteriores, com base em modelo semelhante ao de vias expressas de Santiago, no Chile.

Na campanha eleitoral, Doria admitiu a possibilidade de discutir a adoção de pedágio urbano, sem tratar especificamente das marginais.

"Acho que esse é um tema que tem de ser estudado. Não é o ônus que você aplica de forma generalizada. Se você quer usar seu veículo com mais facilidade, a hipótese de pagar por isso é uma opção, não é uma imposição. Nessa circunstância, principalmente em defesa ambiental, podemos estudar, sim", afirmou Doria, em julho de 2016.

O prefeito esteve em abril em Seul, capital sul-coreana que adota um tipo de pedágio urbano em túneis há mais de duas décadas, mas evitou cogitar medida semelhante.

O secretário dos Transportes, Sérgio Avelleda, não escondeu seu posicionamento a favor de pedágio urbano, embora avalie se tratar de discussão de longo prazo. "Vamos ter que chegar a discutir isso, mas tem uma lição de casa a fazer primeiro. Não só a qualidade, mas melhorar a oferta de transporte público", afirmou à Folha, em Seul.

"Mas acho que é uma conversa longa com a sociedade. É preciso vencer essas desconfianças, entregar algum benefício antes e demonstrar os benefícios vindouros."

Matéria publicada na Folha de S. Paulo.

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